O turismo rural e o mundo jurídico

A problemática da usucapião e dos crimes ambientais no turismo rural

O seguinte artigo vai tratar de um caso isolado que abriu precedentes para vários outros.

Sabemos que o turismo rural e o mundo jurídico andam de mãos dadas (ou ao menos deveriam) em muitas vertentes: em relação aos pagamentos de taxas e impostos (com projeto de lei sendo votado ainda no ano de 2020), nas relações de trabalho (modalidades, acordos, jurisprudências, OJS), preservação ao meio ambiente (direito civil e ambiental andam de mãos dadas nessa esteira), mais uma das maiores problemáticas se dá com o advento de um caso ocorrido em uma cidade do interior de São Paulo.

Vamos tratar desse assunto, tanto quanto da necessidade de se manter a terra e adjacências em bom estado, evitando multas, crimes e processos jurídicos.

Mas comecemos com a história:

Em um hotel fazenda de uma cidade do interior do Estado de SP (com nome protegido por motivos óbvios, esse caso ocorreu e gerou grande repercussão nacional no que tange ao direito de imóvel.

Com uma história de pelo menos 15 anos de mercado, o hotel fazenda era conhecido e indicado por todos que procuravam turismo rural. No final do ano de 2001, um hóspede se hospedou no hotel e ficou lá durante todas suas férias (um período de exatos 28 dias). Nesse tempo, fez amizade com os funcionários e também com o responsável pelo local.

Em conversas informais, ele descobriu que o terreno era herdado da família do proprietário. Porém, como o próprio proprietário informou: “não está em meu nome ainda, preciso fazer todos os trâmites necessários e o hotel não me dá uma margem de lucro tão grande para isso, ainda”.

O hóspede registrou essa informação e voltou para sua vida em sua cidade. Após descobrir uma traição, desanimou da vida, pediu a conta em seu trabalho e se mudou para uma pequena casa na cidade do hotel fazenda.

Com sua parte do dinheiro, conversou com o responsável pelo hotel e entraram em um acordo (não escrito), de que, ele ajudaria a levantar o hotel, e depois veriam sobre as coisas jurídicas necessárias, precisavam primeiro fazer o hotel voltar ao seu auge.

Quando teve o positivo do responsável, ele se mudou para uma pequena casa que ficava no mesmo terreno do hotel fazenda. Conversaram e decidiram que dessa maneira, ele pouparia dinheiro, o que ajudaria ainda mais nas contas do hotel, bem em comum que agora possuíam.

Começou a prestar serviços de pequenos reparos, e os anos passaram. Especificamente 5 (cinco) anos. Após esse período, o hotel fazenda já estava de pé novamente, em pleno funcionamento e na boca do pessoal. O turismo estava excelente e os ganhos também.

Então, se aproveitando da situação, o mesmo deu a cartada final: entrou com um pedido judicial de usucapião de toda a extensão do hotel fazenda.

Quando o responsável descobriu, quis saber o motivo, mas já era tarde: a causa tinha sido ganha por seu sócio, que provou todo o necessário no caso de uma usucapião rural:

“A usucapião rural, também denominado pro labore, tem como requisitos a posse como sua por 5 (cinco) anos ininterruptos e sem oposição, de área rural não superior a cinquenta hectares, desde que já não seja possuidor de qualquer outro imóvel, seja este rural ou urbano. Ainda apresenta como requisito o dever de tornar a terra produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia. Já a usucapião urbana, também denominado de pro misero ou pró-moradia, tem como requisitos a posse sem oposição de área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados por 5 (cinco) anos ininterruptos, utilizando-a como moradia sua ou de sua família, sendo vedada a posse de qualquer outro imóvel. As usucapiões rural e urbana estão previstas nos artigos 1.239 e 1.240 do CC, respectivamente.”

Dessa maneira, ganhou a terra, comprou o hotel de seu sócio e fim da história.

O problema apresentado acima, nos levará para algo que ocorre muito em centros urbanos, mas demais em localidades rurais: a posse da terra por usucapião, agindo de má-fé. Não nos importa o desfecho disso, se o dono recorreu ou não, importa sabermos como evitar isso.

E a coisa se torna mais problemática ainda, quando nos damos conta que, o turismo rural ainda não é algo juridicamente reconhecido. Existem projetos de lei em tramitação, mas nenhum ainda reconheceu o potencial e riscos e seguridades jurídicas da efetuação do turismo rural como trabalho.

Impostos deveriam ser tributados de forma correta, descontos também, tendo em mente que, o turismo movimenta a economia e também a agropecuária. Mas mesmo sendo um fator determinante desde 1970, o turismo rural ainda anda quase na ilegalidade por não ter normas jurídicas para se basear ou ter respaldo quando necessário.

Nessa esteira, quando o imóvel é alugado, não existirá nenhum problema semelhante a este. Existe um contrato que será assinado, e a partir do momento que, ambos demonstram seus interesses, e a terra possui um dono legitimado… não há nada que possa ser feito de má-fé. Não surtirá nenhum efeito se houver alguma tentativa.

Como muitos locais de turismo rural se encontram em áreas rurais e cidades do interior (geralmente é passado de família para família as terras), acaba que, algumas pessoas não fazem o necessário para que a terra seja sua.

Após o evento morte, em caso de sucessão, os herdeiros devem fazer a partilha do bem, e o espólio deve ser pago. Estamos falando de fazer o inventário do local.

O processo do inventário é caro, por isso muitas pessoas escolhem não fazer. Deve-se escolher um advogado especialista em Sucessões, e ter todo o processo terminado em um prazo de 60 dias, como prevê o artigo 983 do Código de Processo Civil. Caso haja atraso, a Fazenda Estadual pode e cobrará multa, além de juros e correção monetária.

Os impostos devem ser pagos, tal como as dívidas oriundas do (a) falecido (a), e todo o processo depois segue de maneira célere.

Quando isso ocorrer, nenhum hóspede poderá agir de má fé.

Então mantenha isso em mente se você é “dono” de uma propriedade que ainda não passou pelo processo de inventário.

Se ainda não foi feito esse processo, o melhor a se fazer é reunir os herdeiros, discutir as dívidas, pagar as multas e abrir o processo do inventariante o quanto antes.

Como dito no começo do texto, não somente existe uma problemática quanto a usucapião no turismo rural. Um dos temas mais complicados e deve estar sempre na ponta da língua dos proprietários (não somente proprietário, mas o responsável mesmo) do turismo rural, é a preservação ambiental.

Sabemos que, por ser turismo rural, muitas fontes primas da natureza serão exploradas. Até aí, tudo bem. Só não pode ser explorada além do normal, de maneira que venha a agredir o meio ambiente, pois além de crime ambiental, também caracteriza como crime penal em sua pena.

Então algo a se ter em mente sempre, principalmente se seu local de turismo rural faz uso das matérias primas da natureza é: usar de maneira correta e consciente.

Isso se aplica na preservação do solo, preservação da fauna e da flora e também na não poluição de águas de rios, riachos e adjacentes.

Na esteira da poluição qualificada, é bom lembrarmos que é de natureza permanente, perdurando enquanto o agente poluidor deixar de cumprir ordem para reparar o dano ambiental. Com isso, a prescrição não terá início enquanto se mantiver a desobediência.

Tudo isso encontra sua base no artigo 54, parágrafos 2º, I, II, III e IV, e 3º, e no artigo 56, parágrafo 1º, I e II, combinados com o artigo 58, I, da Lei 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais).

Neles se instituem o descarte incorreto de lixo tóxico, mas não somente isso: a não remoção do mesmo e o ato continuamente ser praticado.

Portanto é sempre bom, se possível, contar com uma assessoria jurídica qualificada em dois centros específicos: direito civil e direito ambiental. As duas assessorias vão lhe garantir, de maneira correta, o que deve ser feito, o que deve ser evitado, e caso algo já tenha ocorrido, o que se pode fazer.

Muitas vezes vem a tona a alegação de que não sabia que aquilo se tratava de crime ambiental, mas é bom sempre lembrar que, no sistema jurídico brasileiro, o simples fato de alegação de desconhecimento não é questão de anulação ou nulidade, vide o contido no texto jurídico encontrado na LINDB (Lei de introdução às normas do direito Brasileiro):

“Dispõe o art. 21, caput, 1ª parte, do CP: ‘O desconhecimento da lei é inescusável’. Em igual sentido, estabelece o art. 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei 4.657, de 4 de setembro de 1942): ‘Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”.

Em suma, para ter seu turismo rural funcionando às mil maravilhas, além de cuidar de toda a questão interna, o externo também deve ser sempre observado. Dessa maneira, você não possuirá problemas, apenas lucros e felicidade.

Artigo em Parceria com Caio G.

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